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domingo, 23 de agosto de 2009

Parte do discurso de CRISTOVAM BUARQUE (21/08/2009)


Nós negamos o Senado, em si, ao negarmos analisar denúncias, ao negarmos descobrir e mostrar a verdade.
Mesmo assim, tentamos. Não conseguimos passar pela Mesa a ideia de o plenário debater. Vamos ter de deixar que o povo decida. Temos de reconhecer, manifestar e aceitar a impotência daqueles que lutaram contra isso. Temos de reconhecer a derrota aqui dentro e perguntar ao povo se quem é derrotado merece ou não voltar aqui depois. Os que cometeram crimes, nós sabemos, não merecem voltar, embora o povo possa trazê-los – eu até acho que é provável que vá trazê-los de volta. Mas os que foram derrotados também têm de passar pelo voto. O povo tem o direito de dizer: “Você não fez parte disso, mas você foi incompetente para enfrentar tudo isso. Você não merece o mandato não por corrupção, mas por incompetência”. Nós temos de reconhecer aqui a nossa derrota, reconhecer a nossa incompetência. No máximo, podemos pedir desculpas, o que não adianta muito, e esperar o que o povo vai decidir depois.
Agora, temos o direito de cobrar do povo. Se você queria saber a verdade, e não fomos competentes para mostrá-la a você, você tem o direito de ir para a rua cobrá-la. Mais do que o direito, você tem a obrigação de ir para a rua cobrá-la. Hoje, o povo brasileiro, diante do fracasso do Senado, é quem está com a responsabilidade de continuar a luta que perdemos aqui. Joguem-nos a culpa pela incompetência, mas não se acomodem, porque aí a culpa também é de cada um de vocês.
Vinha recebendo centenas de e-mails, todos criticando a situação do Senado, e eu respondia, dizendo o que estávamos fazendo. A partir de agora, não vou mais poder dizer o que estamos fazendo. A partir de agora, vou ter de perguntar: “E você, que me mandou o e-mail, o que está fazendo além do e-mail?”. São importantes os e-mails, as cartas, os telefones, mas não vai ser por aí que vocês vão conseguir mudar a realidade daqui de dentro, contra a qual um grupo de nós lutou, mas não conseguiu derrotar. Vocês têm de vir para o Senado, para o Congresso; vocês têm de se manifestar nas ruas diante de cada um de nós. Vocês vão ter de se manifestar como fez outra geração na luta pelas Diretas, na época da luta pela anistia, na época da luta pela eleição direta de Presidente. Vocês vão ter de se manifestar pela ética no Senado; porque, se não fizerem isso, aqui dentro, nós não vamos conseguir fazer.
Nós até podemos arquivar, como foram arquivados os processos, mas o povo não arquiva, o povo aceita ou luta contra. E eu espero que o povo lute contra, para ajudar a ressuscitar o Senado, porque, sem ele, não há democracia.
Hoje, mais cedo, alguns discutiam se estamos diante ou não de um regime autoritário. Eu digo que nós estamos dando os primeiros passos para isso, porque, em um sistema republicano, se um Poder, o Executivo, tem mais força do que o Legislativo, já se tem um passo dado em direção ao autoritarismo.
E nós temos de lutar contra o autoritarismo, seja o autoritarismo que vem do Executivo para cá diretamente, seja o autoritarismo de hoje, em que o Poder Executivo vem para cá não diretamente, mas através dos Senadores ligados a ele, através da sua tropa de choque, através daqueles que se submetem a tudo que o Executivo manda para cá. Hoje, a tudo o que o Governo manda para cá, nós nos submetemos. Na hora das medidas provisórias, balançamos a cabeça; na hora de um Conselho de Ética, os Senadores ligados ao Poder Executivo mandam engavetar as denúncias que existiam.
Hoje, nós já estamos dando um primeiro passo em direção ao autoritarismo. E no autoritarismo, Senador Simon, o segundo, o terceiro e o quarto passos vêm muito depressa quando a tolerância da população aceita.
Embora alguns digam que vale a pena recorrer ao Supremo, mesmo que alguns insistam em ir ao Supremo – eu tenho minhas dúvidas pela defesa que faço da independência entre os Poderes –, eu acho que o que a gente pode fazer é dizer: “Nós lutamos, nós perdemos e nós colocamos nas mãos de vocês, sobretudo da juventude brasileira, a luta para que não seja perdido o direito de saber a verdade, o direito de saber a verdade”. Não podemos arquivar isso. Arquivem-se os processos, mas não arquivem o direito de saber a verdade. Vocês têm de lutar para que essa verdade aflore, para que ela surja, seja para perdoar – eu até gostaria de reconhecer que não houve erro, até melhor – ou para tomar as medidas punitivas necessárias.
A partir de agora, eu não vou continuar. Reconheço o fracasso nesse caso concreto.

Fonte: Agência Senado

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